A definição do controle societário sempre foi ponto impactante na dinâmica empresarial, uma vez que estabelece os detentores do poder decisório nas deliberações sociais. Quem possui o controle societário pode alterar disposições do contrato social, destituir administradores etc.
O Código Civil (CC) prestigiava um controle absoluto do capital social, estipulando matérias, como alteração do contrato social, que dependiam da aprovação de 3/4 (três quartos) do capital social. Todavia, com o advento da Lei n. 14.451/22, o legislador trouxe maior dinamismo às sociedades limitadas, valorizando as decisões tomadas por maioria simples, bastando mais da metade do capital social, e revogando o antigo quórum de 3/4 (três quartos) para alteração do contrato social.
Por conta disso, os sócios que, em conjunto ou isoladamente, possuam mais da metade do capital social, maioria simples, podem alterar o contrato social para diminuir o quórum de 3/4 (três quartos) eventualmente previsto no contrato social, modificando o poder de controle? Segundo o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), no julgamento do Recurso n. 14022.048117/2024-14, de 23 de maio de 2025, sim.
Na oportunidade, o recurso buscava a validação da decisão tomada pela maioria simples do capital social que, após deliberação prévia de todos os sócios, aprovou a reforma do quórum para alteração do contrato social, passando de 3/4 (três quartos) para mais da metade do capital social, seguindo-se as alterações legislativas.
A respectiva modificação foi ponto de discussão, posto que uma das sócias dissidentes pleiteou a anulação do registro, para que prevalecesse a disposição contida no contrato social em detrimento do quórum legal. Entretanto, segundo o DREI, a alteração contratual foi realizada em estrita observância das formalidades legais e regulamentares, motivo pelo qual deveria preponderar a vontade da maioria simples em relação ao quórum anteriormente previsto.
Contudo, deve-se observar que o caso cumulava algumas situações ímpares, são elas: (1) a convocação e a realização de reunião com a presença de 100% (cem por cento) do capital social e com a estrita observância das previsões legais; (2) a existência de cláusula no contrato social que definia expressamente a regência da sociedade pelos artigos 1.052 a 1.087 do CC; e (3) a regular vigência da nova redação do art. 1.076 do CC à época da deliberação.
A conclusão que se chega a partir da decisão do DREI é de que, embora o contrato social eventualmente exija quórum superior a mais da metade do capital social, desde que observadas as formalidades legais, podem, os sócios que representem mais da metade do capital social, promover a diminuição do respectivo quórum, fazendo-se prevalecer sua vontade perante à maioria absoluta.
A nosso ver, a decisão foi acertada, já que previsões contratuais contrárias à atual lei são ilegais. Nada mais justo do que adequar o contrato social à atual imposição legal de norma cogente.
Por:
Augusto Becker – OAB/RS 93.239
Kawe Corrêa Saldanha – OAB/RS 133.161